Dossiê

FÚLVIA GONÇALVES – dossiê

exposição: 04/05 a 06/06/2005

Há vinte anos, isto é, em 1985, Fúlvia Gonçalves mexeu no lago plácido da arte dos museus e criou círculos concêntricos em torno de uma idéia recorrente e sempre genial: buscou e encontrou a Mona Lisa não no seu santuário de séculos, a sala de exposições, mas nos salões bordelizados do mass media, a propaganda, os vidros de conserva, as páginas de jornais e revistas de variedades.

Fúlvia fazia assim o oposto de Marcel Duchamp que deslocou um urinol a uma exposição para elevá-lo à condição de arte; e conseguiu-o, apesar e sobretudo graças à onda de indignação que se seguiu: seu rude objeto é hoje um símbolo da arte rebelada das primeiras décadas do século 20. Fúlvia, ao contrário, recolheu os fragmentos de uma Gioconda banalizada e deu sentido novo a seu enigmático sorriso, para além dos propósitos de Da Vinci e dos diluidores do século da publicidade.

A arte tem disso: ela cria símbolos que se fortificam com o tempo e vão se ajustando à sensibilidade das gerações. A Mona Lisa de Fúlvia faz agora vinte anos. No panorama sincrético da arte dos anos finais do século, o engenho de Fúlvia deixou um traço que não se interrompeu. O público de hoje pode assim estabelecer um vínculo com aquele dado momento (de algum modo alterando o momento atual), como Fúlvia, em 1985, o fez com Da Vinci, Duchamp e até mesmo Andy Wahrol. E eis uma história que terá continuidade.

Ao apropriar-se de imagens e signos, Fúlvia descontrói para construir. Esta é a força de sua arte e contém seu próprio segredo. Nela, a forma joga um jogo importante. Fúlvia necessita de simetrias para obter, a partir do caos ou do objeto atomizado, o seu mundo de equilíbrios. Ela portanto busca o harmonioso, cuida de dar sentido ao disperso e dialogar com uma certa tradição, mas renovando-a sempre. Isto é tanto verdade no caso da Gioconda (fragmentada ao longo de séculos e sobretudo pela iconografia derrisória do último) quanto na série “No arquivo das formas”, magnífica em si mesma e na qual a busca de êmulos na história resulta num inventário não só de formas como também de cores e linguagens.

Com essa riqueza de elementos, Fúlvia Gonçalves consegue ser profundamente original sem romper com as linhagens a que pertence e, mais ainda, sem deixar de pertencer a si mesma.

EUSTÁQUIO GOMES

Escritor e jornalista
texto da apresentação do convite da exposição

Produção gráfica: Ivan Avelar e Profa. Berenice Vasco de Toledo


Fúlvia Gonçalves: série Embalagens 2004 A artista nos dá uma excelente visão do mundo das tormentas sem abrir mão do equilíbrio. Talvez por isso a dor e a angústia do ser fiquem tão terrívelmente agradáveis. E como é agradável portar-se diante das obras dessa artista que domina sua expressão a ponto de permitir-se uma estética cuja conseqüência é relaxar o observador e deixa-lo à vontade para perceber a obra em sua especificidade, tomando consciência das relações que com ela desenvolve. O domínio da artista sobre a matéria da obra responde, em grande parte, pelas sensações de agradabilidade e liberdade, permitidas ao observador, infreqüentemente na arte contemporânea.

(E. Dionisio / MACC)


Fúlvia Gonçalves, série NO ARQUIVO DAS FORMAS 2003 Há com efeito, no que Fúlvia realiza, a presença de uma personalidade ao mesmo tempo inteligente e sensível, para quem o ato de pintar não é prazer ou repouso, porém a dura procura da expressão certa, que brota do mais profundo do seu ser, alimentando-se de sua sensibilidade filtrada, depurada, corrigida pelo raciocínio.

(J. R. Teixeira Leite / historiador e crítico de arte)


Fúlvia Gonçalves. Colagem. tese de doutoramento sobre Gioconda. Das imagens resguardadas nas entranhas vegetais às arquivadas em embalagens táteis, existe todo um caminho intercalado seja pelas escadas, ou através da fresta de uma porta onde a árvore ou prancha de madeira antecipam um instante velado. Racionalidade e emotividade caminham juntas.

A aura concretiza a instalação onde a artista recupera o seu júbilo com a forma da Mona Lisa, objeto de sua tese de doutoramento. O lúdico joga com o estético numa feliz composição. A tradição não se congela mas explode numa tradução de domínio e expressão do espiritual ao longo de uma vida dedicada à Arte.

Em Fúlvia: o interior e o exterior. Formas, vibrações, cor e composição. Emoção e memória.

Tal como assim revelou a artista:

“Este trajeto é  uma relação com o espaço e o tempo. É mais uma reflexão que registra princípios poéticos que se mantém ao longo de uma ampla trajetória…”

Marialice Faria Pedroso / arquiteta e historiadora da arte)


Fúlvia manipula conceitualmente os elementos que dispõe ao seu talento: se apropria de formas, figuras, signos. Recorta o espaço para, compositivamente, expor suas razões mais íntimas, suas intuições mais emergenciais…

Vibra na analogia das cores (ocres, vermelhos, carmins, marrons – prioritariamente… verdes, azuis, violetas), nas texturas (tanto gráficas quanto materiais) e na emoção das formas: circulares… ou orgânicas… ou objetuais… como se fossem insistentes paisagens interiores. Mais ou menos assim: [ligações. Histórias e existências. É a recriação].

(Prof. Dr. Marcos Rizolli)


FÚLVIA GONÇALVES: DOSSIÊ

série:

Embalagem2004
técnica mista
60×80 cm

vista da série Embalagem 2004, Fúlvia Gonçalves
série:

Esferografia

Fúlvia Gonçalves Fúlvia Gonçalves. Sementes 1. Esferografia Fúlvia Gonçalves. Sementes 2. Esferografia Fúlvia Gonçalves. Sementes 3. Esferografia Fúlvia Gonçalves. Sementes 4.  Esferografia

 

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