Sorte Revelada, Descaminhos e Descobertas | Recapturas em Gestos

A Galeria do Instituto de Artes – GAIA/UNICAMP convida para as exposições que ocorrerão no mês de agosto a setembro de 2017.

 

 

 

Estão aqui obras de 13 artistas organizadas em dois grupos. São fotografias recentes feitas em placa úmida de colódio, uma técnica do século XIX.

Sorte Revelada é resultado de um projeto anual de produção artística que está em sua terceira edição em São Paulo. Neste ano, os artistas tiveram como ponto de partida criativo frases contidas em biscoitos da sorte.

Em Descaminhos e Descobertas estão os percursos de pesquisas, investigações e trabalhos com temas de referência pictórica – como retratos, paisagens e naturezas mortas, habitualmente atrelados às placas úmidas de colódio. São experimentos, erros e surpresas que tornam cada imagem, na fragilidade de seu suporte, carregada de uma força que resiste aos modos de produção tecnológicos atuais.

A placa úmida de colódio surgiu na Inglaterra em 1851 pelas mãos de Frederick Scott Archer, que publicou todo o processo sem patente. Sua pesquisa inicial objetivava produzir uma imagem negativa (matriz para cópias) de prata sobre vidro, usando o colódio como “cola”. Mais sensível que as técnicas anteriores, a placa úmida ainda exige tempos de exposição de alguns segundos. A necessidade de executar todo o processo com a placa ainda úmida dos banhos químicos não só dá o nome à técnica como também exige um laboratório no local para rápido processamento da imagem.

Em pouco tempo, apareceram variações do processo, como os positivos diretos em placas de vidro (ambrótipos) ou metal (ferrótipos). Os retratos assim feitos ganharam prestígio e trouxeram uma estética marcante. A junção do químico – o colódio –, com a óptica da época – as lentes do tipo Petzval –, criaram uma imagem de alta definição, mas que, ao mesmo tempo, parece etérea. O véu invisível que recobre a imagem revela também uma poesia que carrega significado de seu próprio nome: ambrotos, do grego, que quer dizer imortal.

Esta técnica foi o principal método de captura fotográfica até cair em desuso, por volta de 1880, quando as placas secas de gelatina de prata ganharam a preferência comercial.

A placa úmida de colódio ressurgiu nas últimas décadas nos EUA e Europa por conta de pesquisas individuais e de pequenos grupos. No Brasil, Roger Sassaki conduz suas pesquisas desde 2012 e as divulga pelo blog Imagineiro. O canal acabou por dar nome ao grupo Imagineiro, que busca não só a importante pesquisa da prática da técnica (desta e outras) como discutir seu lugar na criação fotográfica contemporânea através do incentivo à criação de obras inéditas como estas reunidas aqui.

www.imagineiro.com.br

 

 

 

Galeria de fotos – Sorte Revelada, Descaminhos e Descobertas

 

O pêndulo entre certeza e dúvida no registro de uma determinada realidade através da linguagem fotográfica tem seu contraponto no campo da ficção e imaginação. Como ser fidedigno no campo da visão, dar vazão à realidade de coisas visíveis e invisíveis e ter um pensamento com total liberdade? A priori, parecem campos antagônicos mas podem ser equidistantes quando, na construção da imagem, o passado se transporta para o presente e o futuro que está por vir, torna-se um presente possível. Por isso, a gênese e os meandros da representação são mimetizadas no momento da captura da imagem, enquanto que o desconhecido emerge na hora da revelação no laboratório ou diretamente pela luz solar possibiltando novos repertórios e incorporando cada etapa desse caminhar. Durante esses processos criativos como lidar, recortar, copiar, manter na memória esse primeiro momento de instante fundante do olhar?

São transitoriedades, oscilações, elos desconhecidos, registros, pertencimentos, rastros de um tempo e lugar que surgem para serem explorados e contextualizados pela fotografia contemporânea mesmo quando se usam processos mais antigos como a placa úmida, câmera escura, papel salgado, marrom Van Dyke, a goma bicromatada, cianotipia, pinhole, indo dos analógicos aos atuais recursos digitais. As imagens de Hantzschel e Milani surgem entre esses limites e pontuam alguns extremos. O suporte de suas obras, já por si mesmo, abre para uma narrativa ficcional, mesmo que as imagens sejam registros fotográficos de um lugar, elementos da natureza, paisagens ou retratos. São feitas em papéis emulsionados e vão recapturar a realidade já tão distante do aqui agora interpretando uma abordagem de descontinuidade entre as coisas da materialidade e do pensamento humano. As possibilidades de captação, impressão, pesquisas de técnicas, tangenciamento com outras linguagens artísticas também abarcam o campo da subjetividade e potencializam espaços para ensaios fotográficos, foto-livros e um posicionamento autoral.

O suporte eleito, composto de papel aquarela, sal e prata, carrega na superfície imagens de um mundo à parte. A aplicação manual do sensibilizante com pincel agregou o gesto, aumentando a presença do acaso no processo do papel salgado. (Hantzschel) A impressão em processos fotográficos arcaicos como a cianotipia.

Ocorre o emulsionamento dos tecidos e papéis com químicos fotossensíveis, sua secagem, a composição criada com negativos e objetos diversos sobre superfície sensibilizada, a exposição ao sol ou em câmeras de luz ultravioleta para fixacão da imagem, a lavagem para que a imagem se revele por inteiro e finalmente a secagem. (Minami)

As obras desta exposição revelam dimensões indescritíveis e ganham força por essa aparente diferença entre presença x imaterialidade, indeterminação x persistência e elasticidade x atuação. São fotografias ganhando novas dimensões diante desse vasto universo da imaginação e experiências que passam a ser preâmbulos de um ver continuum. São feitas de camadas de gestos impregnadas de uma invenção e seus títulos SAL/SONHO/TRICROMIAS abrem outros territórios para reflexão. Por isso esse avistar, ver, captar, impregnar, recapturar têm seu lado luminoso para a consciência humana.

Curadoria
Profa. Dra. Ivanir Cozeniosque
Departamento de Artes Visuais/Instituto de Artes

 

Galeria de fotos – Recapturas em Gestos