Impressões…

 

IMPRESSÕES SOBRE UM TERRITÓRIO FRÁGIL

Exposição de dissertação de mestrado em Artes Visuais

03 a 20 de julho de 2007 – Galeria de Arte

Defesa de Mestrado: 23 de agosto 2007 – 14h

Local: Pós-graduação do Instituto de Artes – UNICAMP

 

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IMPRESSÕES SOBRE UM TERRITÓRIO FRÁGIL

 

A exposição IMPRESSÕES SOBRE UM TERRITÓRIO FRÁGIL, é parte da defesa de mestrado em Artes Visuais realizada no Instituto de Artes da Unicamp.

Todos os caminhos que permeiam a produção apresentada são pautados nos modos de ver, refletir e observar o espaço que ocupamos no mundo. O que me move, o que me leva ao fazer artístico é uma necessidade primária de expressão, um impulso interior que necessita ser atendido. Quando surge alguma limitação, a situação é reinventada, para dar espaço ao fazer.

São impressões pessoais acerca deste território frágil que é o corpo humano, que se apresentam por meio de dois procedimentos, a litografia e a frottage.

O interesse em trabalhar com o corpo humano se manifestou a partir da experiência   de uma fratura que ampliou minha consciência em relação à fragilidade humana. Nosso corpo, objeto frágil em potencial, é suscetível, permeável, vulnerável aos impactos, as mudanças ambientais, que podem produzir fragmentos em instâncias físicas e emocionais.

A referência para realizar os trabalhos é o corpo humano em escala real. O corpo, ocupa um lugar no espaço, possuímos uma concretude física feita de matéria viva, assim ele é nossa presença, nosso estar no mundo, é a testemunha de nossa existência e mediador entre dois territórios, o dentro e o fora.

Com a litografia, o registro direto do meu corpo e a frottage corporal, abrem espaço para a exploração da textura da pele, das superfícies, das estruturas, do volume do corpo humano.

 

“O mais profundo é a pele.”
(Paul Valéry)

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A PELE COMO FRONTEIRA

A pele é uma referência importante no trabalho. A pele é o limite do meu território com o do outro, com o mundo, abriga e delineia a individualidade, nos protege e nos expõe. O maior órgão do corpo humano é também o seu invólucro e sua fronteira com o meio ambiente, assegura a intimidade dos demais órgãos, e os protege. A pele é nosso órgão de contato, inventa nossos cheiros e nos permite o toque, o abraço, a percepção das coisas em seu estado real. O papel da pele como interface humana apresenta, a maneira como nos colocamos no mundo, como nos inserimos e interferimos no meio ambiente.

O tato é um “sentido de proximidade”, é desse contato, da nossa necessidade de aproximação com o outro que afirmamos nossa própria existência, pois o tato nos permite perceber que a vida tem profundidade e contorno, torna tridimensional nosso sentido do mundo e de nós mesmos.

Assim, a pele é também nosso espelho, nos mostra a passagem do tempo, um campo fértil para a manifestação de sentimentos, arquétipos, desejos e repulsas.

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FROTTAGES CORPORAIS

Durante o trabalho no atelier, ao terminar uma impressão, no processo de limpeza das mãos num pedaço de papel, deixei impressa parte da minha mão. Esta imagem me interessou, pois a partir dessa ação, percebi outras possibilidades de trabalhar com a estrutura do corpo e com essa experiência tátil, pude explorar os volumes, as articulações, as estruturas, bem como a superfície da pele. Iniciei uma série de frottages corporais. A palavra frottage, vem do francês frotter, que significa friccionar. Na frottage, técnica primitiva de decalque, a maneira como utilizei este procedimento, foi também com a intenção de trabalhar com a aproximação tátil, decalcando formas corporais. Utilizando o papel diretamente no corpo, sua superfície é “moldada”, o contato da mão diretamente no corpo, que busca absorver seu volume, sua tridimensionalidade traz a informação gráfica em escala real do corpo decalcado. Iniciei a série das frottages corporais. Algumas frottages são fragmentos do meu corpo, outras são de corpos de pessoas afetivamente ligadas a mim, que colaboram intensamente na construção da minha história e participam do meu cotidiano.

Realizei a série Matriz, em que o suporte para as frottages corporais é o corpo da minha mãe, minha matriz. Registrei o processo das frottages corporais com algumas fotografias que mostram a questão do volume, o envolvimento do corpo pelo papel, as questões de luminosidade e sombra, que somente no momento da frottage é possível definir com a pressão do carbono.  

O trabalho com as frotttages corporais mantém uma veracidade relacionada com a escala do corpo, assim os trabalhos assumem grandes dimensões, a exploração da ocupação do espaço é uma questão recorrente.

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LITOGRAFIA – O CORPO, A PELE E A PEDRA

Pode-se considerar o trabalho realizado com a litografia, auto-referente, no sentido da escolha do meu corpo para ser registrado na pedra, pode ser a auto-biografia de um corpo, que ao ser impresso, dialoga com questões universais, pois as questões relacionadas ao corpo, seja qual for o viés, trata da condição humana, da sua presença no mundo, suas fragilidades e limites.

Na litografia, desde a preparação das pedras, da granitagem com os diferentes grãos, já existe aí uma manipulação direta com o suporte, até o preparo do corpo, que é entintando e impresso diretamente na pedra, para a construção das imagens.

Na frottage, esta técnica primitiva de decalque, a maneira como utilizei este procedimento, foi também com a intenção de trabalhar com a aproximação tátil, decalcando formas corporais.

Escolhi a litografia como meio para realizar este trabalho, pois encontrei nesta técnica de gravura a possibilidade de contato direto com o suporte, explorando as questões dos processos táteis e a possibilidade de trabalhar com a escala real do corpo.

Ao trabalhar com este contato direto do corpo sobre a pedra, acabei subvertendo a questão técnica tradicional da litografia, onde deve-se ter o cuidado para não tocar a pedra, pois a gordura natural que nosso corpo produz, deixa marcas impressas, assim só os materiais tocam a pedra. O princípio do meu trabalho em litografia foi explorar exatamente a gordura do corpo adicionada a tinta gordurosa depositada com rolo, para deixar a marca do meu corpo na pedra.

Ao trabalhar com a escala do meu corpo e ocupar (explorar) fisicamente o espaço das pedras, ampliou a consciência do próprio espaço que ocupo no mundo. Usar a minha escala como referência, a partir do volume que o meu corpo ocupa no espaço, trouxe também a oportunidade de explorar diferenciados ângulos e perspectivas do meu corpo, que continua em processo de descoberta constante, pois a cada novo trabalho percebo novas relações possíveis.

Dentro das normas técnicas tradicionais, na litografia, é preparada uma margem de segurança para trabalhar a imagem na pedra, com a intenção de ter claro os limites que a imagem vai ocupar. Uma margem que inviabiliza a incorporação das bordas da pedra, atuei no limite das bordas. Escolhi as pedras pelas dimensões e pelas imperfeições de recortes e bordas para integrar a imagem que pretendia produzir. A marca da prensa nestas imperfeições e o desenho formado pela irregularidade do corte da pedra me interessam e integram a intenção da imagem, já pensada incorporando essas irregularidades.

A pressão do corpo na pedra é de fundamental importância dentro do processo, pois é o momento do encontro entre pele e pedra. Adotando como fronteira a minha pele, encontrei a forma mais direta, mais verdadeira de comunicação. Diante da minha trajetória e postura diante dos procedimentos com os materiais, e isso independe da técnica adotada, levo esta atuação direta ao extremo nestes trabalhos, em que a imagem é formada pelo meu próprio corpo, com uma referência real, com uma comunicação direta e primária.