Mário Bueno
Pinturas, desenhos e monotipias de 1952 a 1993
Mário Bueno (in memoriam)
1919-2001
Mário Bueno foi um artista campineiro que produziu muitas obras. Consta que mais de mil obras – desenhos, pinturas, colagens, etc – constituem o seu acervo pessoal. Toda esta riqueza é ainda mais surpreendente quando se atenta para o fato de o artista ter iniciado sua carreira relativamente tarde. Teria começado a pintar por volta de seus trinta anos.
O artista afirmava que a sua disposição para as artes já o acompanhava desde a infância. Mas seu emprego inicial foi o de ferroviário. Buscou, a partir de dado momento de sua juventude, desenvolver sua vocação: tornou-se um autodidata na arte.
Sua condição de ferroviário, de viajante, certamente lhe inspirou muito em suas futuras criações, tanto que as paisagens são uma constante em sua obra. Não apenas as paisagens bucólicas, naturais, mas aquelas que contém os elementos introduzidos pelo homem – casas, ruas, vilas, etc.
Em seu acervo existem muitas séries, ou ‘coleções’, cada qual com um tema básico. Assim, além de séries sobre paisagens, há séries com outras fixações ou motivos do artista: trens, navios, barcos, corpos…
Conforme seu desenvolvimento artístico, Mário Bueno ampliou suas abordagens e chegou a compor muitos escritos sobre arte. Passou a produzir obras com elementos abstratos, signos, ‘sugestões’. Enim, como ele próprio dizia, aperfeiçoou sua capacidade de retratar sentimentos.
As obras de Mário Bueno ficaram muito tempo confinadas em sua casa, longe dos apreciadores. Talvez devido ao grande e evidente amor que o artista tinha pelas suas criações. E também devido à sua busca de aperfeiçoamento artístico. Guardaria suas obras para, posteriormente, estudá-las e descobrir-se em sua obra; e, mesmo, descobrir elementos de sua criação ainda inconscientes, por serem feitos de maneira espontânea.
É possível ver em alguns estudos de Mário observações sobre o que vinha à sua cabeça diante de suas abordagens e criações. É impressionante averiguar seus estudos: continham observações inteligentes – sucintas, sensíveis e profundas. Outra face do artista: um bom autodidata e crítico de arte.
Muitas de suas pinturas continham observações e manifestações do cotidiano. Acabavam abordando a temática dos nossos tempos: do homem atomizado, dividido, alienado. Por isso podem até ser consideradas instrumentos de conscientização.
Mas, como o próprio artista ressaltava, conscientização, não contestação. Ele não procurava tornar sua pintura uma ‘arma política’, mas preferia vê-la como uma maneira de expressar suas impressões da realidade do cotidiano comum à maioria dos homens, à grande massa de anônimos que ‘fazem’ o mundo.
Mário Bueno era um construtor. Um construtor muito criativo. Certa vez, conta em uma de suas entrevistas, não possuía tintas para suas telas e teve a idéia de fazer ‘colagens’, e o resultado podemos ver em sua série ‘colagens’, muito bom! Sua obra era pura arte. Os recursos materiais poderiam, às vezes, ser escassos, mas a inspiração e a beleza de seu mundo interior eram ricas. Suas possibilidades sempre eram numerosas. Experimentou diversas técnicas e meios de expressão. O que leva Pedro Manuel a afirmar que em sua arte vislumbra ‘a emocionada compreensão da complexidade da vida’. Ou Olney Krüse a dizer que Mário era um artista que se fascinava “em descobrir tons, misturar cores, inventar processos de pintar”.
Certas cores são recorrentes em suas pinturas, tais como o ocre, o marrom e o cinza. Muitas delas cores que predominam nos trilhos e estações das ferrovias e nas paisagens urbanas. Os motivos geométricos também são uma constante, aparecendo nas mais variadas e criativas aplicações.
Tudo isso nos faz perceber o quão particular e autêntica é a arte de Mário Bueno. Com simplicidade, expressava o seu ser e suas impressões como poucos o fazem; o que só confirma a sua legitimidade. Arte que se mostrou importante no cenário artístico campineiro e brasileiro. Arte de iniciativa. Arte intuitiva. Arte ativa.
Mário integrou o Grupo Vanguarda (1958-1966), fundado por Raul Porto em Campinas. O grupo era a favor de uma ‘arte pura’, genuína, destituída de máscaras e da influência do mercado, confrontando-se com o academicismo ( da ‘arte dos medalhões’ ) e com o conformismo ( da arte elitista, homogeneizada, estandartizada ).
A empreitada teve muita repercussão. Foi criado um museu de arte contemporânea na cidade e surgiram maiores oportunidades para que novos artistas e novos valores artísticos se integrassem no cenário artístico da cidade e do Brasil. Campinas, depois do Grupo Vanguarda, ‘destacou-se como centro produtor artístico de incontestável importância no cenário nacional’, nas palavras de Rogê Ferreira.
Mário Bueno obteve reconhecimento no Brasil e no exterior. Participou de diversas exposições individuais em galerias de São Paulo e de Campinas.
Após o falecimento do artista, a Unicamp adquiriu uma parte de seu acervo: trinta obras selecionadas ( telas e desenhos ) e diversos documentos ( escritos originais, fotografias, arquivos pessoais, biblioteca de arte e estudos/esboços de suas obras ).
texto de Fabrício Prado de Oliveira, aluno do IFCH/UNICAMP e bolsista SAE do projeto História IA, 2004.
Apresentação da coleção de obras do artista adquiridas pela Unicamp